sábado, 26 de novembro de 2011

Brincando de tragicar

Ela voltava do trabalho de ônibus por volta das 18hr, desceu e do caminho que vai do ponto de ônibus até sua casa resolveu comprar pães. Tirou as chaves do bolso e abriu a porta de sua casa, seus olhos cansados refletiam as mesmas coisas de sempre: a xícara suja na pia do café que tomou pela manhã, na mesa algumas migalhas do café da manhã, a toalha na poltrona, o controle em cima da TV. Entrou no seu quarto, sentou na cama mal-feita, deu um suspiro, pensando: ''As coisas parecem não ter mais jeito''; tirou os sapatos, despiu-se e pôs no rádio Edith Piaf, Autumn Leaves para tocar. Tinha o costume de andar nua pelas sua casa, era um hábito estranho como qualquer pessoa cria quando passa a morar só, mas só assim ela sentia o mínimo de liberdade. Colocou a água pra ferver para fazer o café. Voltou para frente do espelho e falou para o seu próprio reflexo com uma voz furiosa:

''Por quê? Por quê não mudas? Por quê te contentas com essa infelicidade, vida miserável, optaste pela solidão por qual motivo? Pensou que a vida seria fácil, que arrumarias um bom marido, teria lindos filhos e um diploma na parede feito filme de sonho norte-americano? Não, os caminhos tomam rumo diferente e tudo depende de nós, por quê tu não agiste quando havia tempo?'' Com os olhos derramando muitas lágrimas com uma aparente calmaria continuou:''E o amor? Cadê isso que todos procuram, todos encontram e divulgam?'' Bateu no peito e arranhou fortemente até sair sangue. ''Tu sequer sentes alguma! Estás ainda viva? Onde colocaram teu coração? Há só vazio em ti! Estás oca...''

Entorpecida, pegou a água que tinha colocado para ferver e queimou suas mãos, soltou um alto grito de dor e depois colocou as mãos debaixo da torneira. Estava enlouquecida e triste. Acendeu o cigarro, se dependurou na janela, tragava elegantemente, sentia a brisa noturna cobrir seu corpo nu, com o olhar perdido nas luzes da cidade.

Baixinho parafraseou Nietszche: ''É necessário ter o caos cá dentro para gerar uma estrela. Não, Nietszche, não tem estrela nenhuma. Exceto se... Quando era pequena costumava pensar que cada estrela no céu era uma morte, a morte não era feia, e sim mágica porque transformava as pessoas em luz. Só assim serei luz.'' Olhou para o céu, soltou um sorriso, abriu os braços e jogou-se do 9º andar.

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